Publico hoje apenas a primeira parte da carta de Nietzsche a Erwin Rohde, na qual N discute detalhes do texto que Rohde estava preparando como uma réplica ao ataque desferido por Wilamowitz-Möllendorf ao Nascimento da Tragédia em seu panfleto intitulado Zukunftsphilologie. Na carta Nietzsche se concentra em detalhes filológicos e procura fornecer a Rohde elementos para rebater algumas acusações infundadas de W-M referentes às suas concepções acerca da pré-história do gênero trágico.
A literatura secundária recente tem procurado desfazer o mito segundo o qual com O Nascimento da Tragédia Nietzsche teria violado os padrões de cientificidade estabelecidos pela filologia crítica de sua época. Estudos como os de Marcelo Gigante, Christian Benne e James Porter mostram que a polêmica entre Wilamowitz-Möllendorf e Nietzsche não pode ser vista como uma polêmica entre a filologia científica e a apropriação ético-estética da antiguidade. Esta carta corrobora a posição recente da literatura secundária, pois nela Nietzsche insiste que a visão da antiguidade exposta no NT é uma visão que se sustenta e que pode ser defendida de um ponto de vista exclusivamente filológico. Ao longo da semana eu espero poder atualizar este post, acrescentar algo a este comentário introdutório e terminar a tradução da carta. Sugestões são sempre bem-vindas. Um bom final de domingo a todos.
Carta de Nietzsche a Erwin Rohde, Basiléia, 16 de julho de 1872.
Aqui tens o título, meu querido e bom amigo; uma invenção de meu companheiro de residência, o prof. Overbeck, acolhida com júbilo e clamor zombeteiro:
A pseudofilologia
do Dr. U. v. Wilamowitz-Möllendorf.
Carta aberta de um filólogo
a Richard Wagner
Seu nome virá então somente no final da carta, ou seja, na conclusão (mas inteiro e com todas as distinções!) Na conclusão você poderá a seu bel prazer se referir ocasionalmente a Wilamowitz como "pseudofilólogo". Ele vale para nós como representante de uma "falsa" filologia e o sucesso de seu escrito ocorrerá também na medida em que ele apareça como tal para os outros filólogos. Quero escrever uma vez mais a Ritschl, em tom grave e penetrante, para que ele abandone a incompreensível ideia de que nós tínhamos em vista um ataque à ciência da antiguidade (ou à história!). Eu havia dito a ele apenas que você pretendia liquidar com este rapazote topetudo em termos estritamente filológicos. Mas a carta de Wagner o horrorizou de tal forma, que ele agora tomou pavor de todos nós. Por isso a preocupação com a "filologia teubneriana"! Eu te recomendo usar a expressão apenas entre quatro paredes.
No que diz respeito à afirmação de Wilamowitz sobre Aristarco e os titãs, não consigo encontrar nada a que ele pudesse querer se referir. Welcker Mythologie I 262 foi quem se pronunciou de forma mais explícita sobre o caráter pré-homérico das lutas dos titãs. Que não me venham mais uma vez com a velha e frouxa asserção do mundo homérico como a juventude, a primavera dos povos e assim por diante! Tal como tem sido formulada, esta é uma asserção falsa. Que este mundo tenha sido precedido por lutas prodigiosas e selvagens, nas quais dominavam a barbárie e crueldade mais tenebrosas, que Homero se ergue como vencedor ao final deste período longo e desolado é uma das minhas mais firmes convicções. Os gregos são mais velhos do que se pensa. Pode-se falar da primavera, desde que antes dela coloquemos o inverno; mas este mundo de pureza e beleza certamente não caiu do céu. Considero minha concepção do sátiro como algo muito importante neste domínio de investigações; e isto é algo de substancialmente novo, não é mesmo? - Causou grande escândalo o fato de que eu tenha dito que o sátiro, em sua representação mais antiga, tem pernas de bode; é totalmente estúpido recorrer exclusivamente à arqueologia para se opor a esta tese. A arqueologia conhece apenas o tipo enobrecido do drama satírico; antes disso encontra-se a representação dos bodes como os servidores de Dioniso e dos saltos de bodes de seus adoradores. As pernas de bodes são o propriamente característico das representações mais antigas; e sem qualquer prova arqueológica eu gostaria de sustentar que os Ούτιδανοί άμηχανόεργοι de Hesíodo tinham pés de bode, isto é, eram capripedes como diz Horácio od. 2,2. e outros poetas (mesmo poetas gregos). σάτυροι explico, assim como τίτuρoι como reduplicação da raíz Τερ (assim como Σίσυφος se relaciona com σοφός). Τορός penetrante, agudo; σάτυροι como „aqueles de grito penetrante”, como epíteto dos bodes, do mesmo modo que μηχάδες o é para as cabras. Eu creio que é uma esplêndida equação: τορός está para τίτυρος = σοφός está para σίσυφος. Se te agrada, você pode citá-la. É óbvio que eu não confundo o sátiro com Pã, como Wil. me acusa [...].
Olá Prof. Rogério!
ResponderExcluirÒtima iniciativa pra quem está se ambientando (e se aventurando) com tradução dos textos de Nietzsche...
Uma coisa que eu notei no blog é que não há a opção SEGUIR ESTE BLOG. Acredito que com esta opção seria interessante pra informar quem acompanha o blog de suas atualizações, principalmente ao acessar os conteúdos fora do computador particular em que se encontram os favoritos etc...
Atenciosamente
Rodrigo
Obrigado pelo comentário Rodrigo. A opção seguir encontra-se na parte superior esquerda, acima da vinheta do blog. Basta clicar em "seguir" e seguir as instruções.
ResponderExcluirCordialmente,
Rogério.
Nossa!É verdade! Havia procurado apenas no menu na barra da direita.
ResponderExcluirO link do Dicionário Worterbuch (mais o Wahrig e o Kluge)foi muito proveitoso uma vez que, junto ao grupo de discussão aqui da Puc, estou tentando me arriscar nas traduções de partes do Kommentar e dos apontamentos de Tautemburg ligados a Zum Lehre der Stil para a minha tese.
Muito obrigado!
Atenciosamente
Rodrigo
Oi, Rogério e pessoal:
ResponderExcluirEstava procurando material para um artigo sobre as composições musicais de Nietzsche quando cheguei aqui e vi o linque para o site de Julien Young. Poderiam indicar mais fontes? Tenho um CD canadense e o que estou encontrando pela web é sempre menos do que traz o encarte (com as composições dos anos de juventude).
Vou enviar o artigo para vcs assim que estiver pronto.
Abs do Lúcio Jr!
Wilamowitz-Möllendorf estava certo. Nietzsche saiu dos padrões científicos e escreveu bobagens.
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